quarta-feira, 16 de abril de 2008

Uma cultura reduzida

Como já exemplifiquei aqui mais de uma vez, a ignorância é algo que me rebela. Acalmem-se, não vou dissertar a respeito do meu colega de curso, muito menos de lula, ainda que mereça ser por mim subestimado. Abro a discussão com um assunto talvez menos polêmico, mas que por si não nega sua relevância.

Conheço vários amigos que já moraram no exterior. Alemanha, Espanha, Canadá e Estados Unidos são os destinos mais escolhidos. Como estudante de Relações Internacionais, nunca deixo de perguntar da experiência por eles vivenciada, do relacionamento que tiveram com o povo estrangeiro, como perceberam a diferença cultural e etc. Como resposta, sempre há considerações semelhantes: além de enfatizarem aspectos que se destacam se comparados ao nosso país( como segurança, limpeza, meios de transporte eficientes,...) sempre relatam a noção um tanto quanto limitada que os outros têm a respeito do povo brasileiro e do Brasil como um todo.

Além de perguntas como "Tu costumas ir de cipó para os lugares?" ou "Como é conviver com os macacos?", alguns dos países já citados muitas vezes definem nosso país em breves palavras: "Mulheres bonitas"; "Samba"; "Carnaval" ;"Caipirinha". São ignorantes ou simplesmente ignorados por suas instituições educacionais que não lhes proporcionam uma formação ampla e não-etnocêntrica, as quais somente enaltecem sua própria cultura e refutam as etnias por eles taxadas de "inferiores"?

Obviamente, no estágio da globalização em que estamos inseridos, não poderíamos culpar as academias por tal formação. Ainda que exerçam influência no modo de pensar de seus formandos, eles têm a liberdade de querer conhecer o desconhecido(e eles, mais que qualquer um, dispõem de ferramentas para isso). Há tantos meios de informação hoje no mundo que facilitam o entendimento e aprofundamento cultural que não há como deixar de classificar esses que nos taxam de meros ignorantes, pelo menos no quesito cultural.

Os Estados Unidos são excelentes limitadores da nossa cultura. Desde os anos 30, quando a política externa estadunidense foi reformulada a fim de tornar a potência norte-americana como hegemônica no continente americano, as nações latino-americanas passaram a sofrer profundas influências deste país. Walt Disney foi o principal protagonista dessa estratégia política. Patrocinado pelo governo, foi responsável por criar dois desenhos que demonstrassem a suposta amizade e união dos países da Latino – América com a dita potência. Dessa forma, nasceu, entre outras figuras, o animado e gracioso Zé Carioca.

Apesar de ter feito grande sucesso não só no Brasil mas na maioria dos países das Américas, ele foi fruto de pesquisas norte-americanas que com certeza reduziram a brasilidade a um estereotipo visto a partir das considerações do país que o produziu. O personagem, assim como o contexto a que é inserido nos desenhos, representa uma visão por demais limitada da nossa cultura. Representado pelo animal papagaio, José Carioca aparenta ser alguém bastante malandro, divertido e despreocupado. Em uma viagem à Bahia, Zé apresenta para Donald a cachaça brasileira, o carnaval, o samba e mulheres bonitas. Usando tal estratégia reducionista, em que fomos classificados e estereotipados, os Estados Unidos então se inseriram como potência superior.

Convém esclarecer o porquê de se enfatizar o Brasil, a Argentina e o México no primeiro desenho produzido. Obviamente, a política externa da “Boa Vizinhança”, como foi designada pelos próprios norte-americanos, decidiu acreditar em uma maior aproximação por tais países justamente por que esses se tratavam de possíveis potências regionais na Latino-América. Estreitando-se, portanto, os laços entre tais nações, a tentativa(não-fracassada) de reforçar a autoridade do país de Roosevelt naquela época seria então facilitada.

Não estou dizendo, de forma alguma, que nossa imagem é conseqüência de um mero desenho produzido pela equipe de Walt Disney. No entanto acredito que tal produção foi determinante para que a percepção que eles têm em relação a nós se tornasse mais predominante.

Acredito que a cultura brasileira tem muito mais o que demonstrar além de samba e caipirinha. Nossa história é riquíssima. Nosso povo, batalhador. Nossas conversas, pertinentes.

O Brasil é um país com potencial. Eu acredito nele e nas pessoas que nele residem. Porém, é preciso que demonstremos a nossa crença. Precisamos nos reafirmar como potência regional; responder à altura a ameaças chavistas; impor-nos quanto à internacionalização de nossas águas; criar resistências em relação à transferência de novas tecnologias(etanol). Precisamos educar a sociedade internacional, demonstrando que não somos apenas o país do carnaval, do futebol.

Mostremos ao mundo que hoje chegamos para dominar, não mais sermos dominados.

É uma pena que o Brasil não dependa somente das pessoas otimistas e determinadas. É uma pena que ainda careça de vontades governamentais para chegar ao seu auge.

Mas eu ainda assim acredito.